sábado, 21 de fevereiro de 2015

Entrevista Paulo Fonseca [Parte 2/2]

Continuação...

Quais são as suas referências e inspirações enquanto escreve?
Esta pergunta surpreende-me. Normalmente perguntam-me quais são as minhas inspirações e referências no que respeita ao mundo literário. A minha resposta a isso é simples. Cresci rodeado de policiais e livros de espionagem; foram essas as minhas primeiras referências, li Agatha Christie, Ruth Rendell, Ellery Queen, Sir Conan Doyle, John Le Carré, Konsalik, para referir alguns. Depois li clássicos como Balzac, Tolstoi, Stendhal, Cervantes, Kafka, Nietzsche, Marquês de Sade, Almeida Garrett, Eça de Queirós, Camilo Castelo Branco, Miguel Torga, etc. O Fantástico chegou-me tarde às mãos - infelizmente; foi o livro «Os caçadores da Lua Vermelha», de Zimmer Bradley, que me conquistou e depois «O Senhor dos Anéis», de Tolkien, fez o resto. Desde então faço um esforço por manter o meu menu literário equilibrado em termos de géneros; todos são importantes. 
Contudo, se a pergunta era efectivamente a colocada, respondo a isso, em parte, reportando para minha primeira resposta à entrevista: a mim interessa-me muito a verdade escondida por detrás da mentira, as coisas que se inventam com um propósito mesquinho e que acabam por tomar grandes proporções, fogem do controlo, e têm grandes consequências, influenciam gerações e, às vezes, a história de nações; sinto especial apetência por estes temas, bem como pela multiplicidade da verdade, ou seja, o facto da verdade, enquanto construção sociocultural, poder variar consoante a perspectiva de quem a observa. Estas são as minhas referências temáticas e posso dizer, sem grande margem para erro, que são 90% da minha inspiração. Os restantes 10% serão os autores contemporâneos que me fazem acreditar que é possível viver da escrita de romances, ser-se respeitado enquanto escritor; cada um deles é um professor, ou mentor, e cada romance pode ser um divertido manual de aprendizagem.

Qual é que acha que é o papel da blogosfera em geral na divulgação literária?
A blogosfera em geral é fundamental na divulgação do que quer que seja, hoje em dia. No que respeita às artes, em especial à literatura, é muito importante.
Para mim, que não contei com uma editora tradicional, a blogosfera tem sido essencial na divulgação do meu trabalho de escritor; e estava tão consciente disso que a primeira coisa que fiz, depois de lançamento de «Império Terra: o princípio», em 2008, foi criar o blogue Imperio Terra. Mais tarde, quando me apercebi que teria de ser eu a promover o meu trabalho, criei um perfil do facebook e - muito recentemente - a minha página de autor paulopfonsecaescritor; criei um site e criei o meu blogue de autor; e é claro, o blogue EPA|Escritores Portugueses Autopublicados, também existe, embora sem conteúdo. Por isso, tenho plena consciência da importância da Blogosfera.
Blogues como este podem ajudar levar novos autores ao conhecimento de novos leitores, podem ajudar a promover o trabalho de escritores que são tão bons, senão melhores, do que alguns dos que são publicados pelas editoras tradicionais e dessa forma ajudá-los a serem notados por essas mesmas editoras.
E sobre a blogosfera deixo ainda um aparte: nem tudo é bom; foi exactamente este facilitismo em publicar opiniões que levou à criação da ideia de que todos podem ser escritores, frequentemente justificada com a anglosaxonização - se é que existe esta palavra - do conceito escritor/Writer. É verdade que no mundo anglosaxónico todos os que escrevem são Writers, e esta panaceia tem sido papagueada por todos os que escrevem livros de autoajuda para escritores, esquecendo-se de dizer que, na Anglosaxónia, ninguém é só Writer, há os Novell Writers, por exemplo. Trazendo isto para a língua portuguesa, teremos de dizer que todos somos escritores, porque sabemos escrever, mas nem todos são escritores de ficção; nem todos podem. Este fenómeno encheu as editoras tradicionais de milhares de trabalhos, o que as impede de chegar a todos; e deu muito trabalho - criou um mercado - para as editoras de autopublicação. Há um esforço a ser feito, quer do sistema educativo português, quer dos governos, no que respeito à criação de uma política de educação cultural que permita, por um lado, apoiar quem pode alimentar a cultura, por outro, fornecer a cultura a quem dela precisa e não a pode produzir e, pelo caminho, separar a palha do joio, pela educação.

Apesar de o livro ter saído recentemente, tem recebido feedback dos seus leitores?
Está a referir-se ao ebook «Marta», com certeza. A Trilogia Império Terra tem fãs à espera do terceiro livro e tive muitos feedbacks positivos. Quanto a «Marta», a situação é muito diferente, quanto mais não seja por ser um ebook.
Vamos falar de ebooks. O ebook é novo no mercado português, no sentido de que as pessoas se sentem pouco relacionados com ele; o português - e não só - gosta do papel e de mexer no papel, do cheiro dos livros. Quem gosta dos ebooks, gosta deles pela ideia de que podem ser gratuitos, o que significa que pagar por ele não faz parte dos seus planos. Apostar nos ebooks, com sucesso, implica apostar numa internacionalização o que obriga à tradução do livro para inglês - pelo menos; e isso é muito caro.
Assim, não posso dizer que tive feedback sobre o ebook: é só mais um, no meio de milhares, e ainda por cima numa língua que poucos entendem. Contudo, quem leu a versão anterior à publicação, os Betareaders, como agora se diz, adoraram.

Tem algum plano literário para o futuro? Pretende reeditar os livros já lançados anteriormente?
Não sei se podemos chamar plano literário à minha firme decisão de continuar a escrever. Mas essa é a única coisa que posso afirmar. O que pretendo, acima de tudo, é conseguir ser publicado por uma Editora Tradicional. No entanto, recuso-me a deixar os meus trabalhos a ganharem pó numa gaveta - falando metaforicamente; se uma editora tradicional não aceitar o meu trabalho, publicá-lo-ei eu mesmo.
Comecei nisto, já lá vão 7 anos; e têm sido bons anos de aprendizado. A única forma de um Editora Tradicional aceitar trabalhos de um novo autor, e repare que não digo autor desconhecido - esses não têm hipóteses -, é se esse autor garantir leitores. A lógica é muito simples, na verdade: as Editoras são empresas, têm de garantir lucros, e lucros são vendas que são conseguidas com legiões de leitores - não há por onde criticar. Por isso, ou se tem a sorte tremenda de alguém pegar num livro e achar que é bom e acreditar que aquele trabalho devidamente promovido pode dar lucro, ou se faz o trabalho de casa e se constrói uma legião de leitores; tem sido este o padrão verificado, nos autores que se autopublicam, especialmente na Anglosaxónia e em ebooks: quando atingem um valor interessante de vendas, as editoras caem em cima deles.
Eu, neste momento, tento as duas coisas. Acredito que meu trabalho tem a qualidade necessária para ser publicado por uma Editora Tradicional e tenho a esperança de encontrar esse alguém que acredite que vale a pena apostar em mim; entretanto, enquanto isso não acontece, quero construir a minha legião de leitores.
Quanto à Trilogia Império Terra, existe um projecto para depois de terminar a revisão final do terceiro volume: apresentar a Trilogia inteira a uma editora para a reedicção dos dois primeiros volumes e a edição do terceiro. Digo, sem papas na língua, que quem apostar em mim, só terá a ganhar, porque o universo da Trilogia tem um infindável filão de histórias a ser explorado; quem leu os dois primeiros livros, sabe bem que existem ali referências que podem dar lugar a novos romances; alguns personagens, só por si, podem dar lugar a novos romances. Tenho muito para dar ao mundo e é por isso que digo que o meu plano passa, de certeza, pela continuidade da escrita.

2 devaneios:

Ana C. Nunes disse...

Infelizmente revejo-me bastante na visão que o Paulo tem do mercado de ebooks em Portugal. Efectivamente a maioria dos portugueses ainda acha que ebooks devem ser grátis e não pensa sequer pagar para ler. Talvez por serem muito apegados ao livro como objecto físico, ou porque assim como ouvem as músicas de graça, vêem os filmes à borla e usam os programas sem pagar, estão habituados a não ter custos com o que, claramente, dá muito trabalho aos criadores. E note-se que com isto me refiro a todas as vertentes do que hoje em dia as pessoas estão habituadas a ter de graça.
Mas já estou a fugir ao assunto. A verdade é que tenho pena que o Paulo não tenha tido mais feedback no "Marta". No entanto espero que em breve publique o final a trilogia "Império Terra" e que alcance mais leitores.

Vanessa Montês disse...

Sim, sem dúvida alguma que infelizmente o mercado de ebooks está nessa "onda". Ou são grátis ou as pessoas não os adquirem, o que é uma pena. É um mercado que acho que devia ser mais bem explorado e o que é pena são os elevados custos, muitas vezes custam praticamente o mesmo que o livro físicos...
Vamos ver se alteramos um pouco isso :)

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