sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Entrevista Paulo Fonseca [Parte 1/2]


Fale-nos um pouco sobre si.
O meu nome é Paulo Pinto Fonseca.
Nasci em Lisboa, em 1973, cresci em Almada, passei uma parte da minha infância no Alentejo e
formei-me em Sociologia pela FCSH. Actualmente exerço funções numa financeira e escrevo sempre que posso e tenho tempo para tal. Gosto de ler e de cinema, gosto de videojogos e sou um entusiasta da arte digital; sou uma pessoa de múltiplos interesses que gosta de saber e aprender coisas novas. O meu sonho é poder viver para a escrita e da escrita.
Interessa-me particularmente o inexplicável, os fenómenos estranhos, as possíveis explicações que se encerram por detrás da explicação oficial e - essencialmente - as verdades escondidas, ou a mentira que esconde as verdades. Com um reportório destes nunca me poderia cingir a um único género literário, porque todos eles me fornecem imensas possibilidades. Ainda assim, prefiro o género Fantástico. Considero-me uma maratonista; isto quer dizer que prefiro o romance ao conto. No entanto, também escrevo contos, porque - por vezes - a história é para um conto e não para um romance.
A todos aqueles fundamentalistas que não admitem o facto de alguém conseguir escrever diferentes géneros, ou àqueles que acham que o Fantástico não é literatura, tenho apenas uma coisa a dizer: ninguém deve assumir que as suas limitações são a norma, nem que a excepção à regra é uma anormalidade.

Como entrou a escrita no seu dia-a-dia?
A primeira coisa que escrevi foram poemas - ainda escrevo. Depois comecei a escrever sinopses - só pela piada. E, finalmente, resolvi participar num concurso escolar com um conto; não era nada de especial, mas serviu para instalar o bichinho. Anos mais tarde, motivado pelo meu professor de português que adorou uma pequena redacção que fiz, sobre um pescador e o mar revoltado - tendo-me chegado a comparar a Raúl Brandão -, voltei a escrever. Nesse ano comecei a escrever o meu primeiro romance policial - ainda não terminado; parei quando entendi que precisava de experiencia de vida para o acabar. Um dia o acabarei... No entanto, até 2006, por diversas razões a escrita ficou para trás, tendo a produção sido reduzida a alguns poemas e contos; em 2006 resolvi que estava na altura de assumir a minha faceta de escritor. Escrever faz-me bem, faz-me sentir completo, faz-me viver, dá um sentido maior à minha vida e dá-me um propósito no mundo. Acredito que seja por isso que a escrita surgiu na minha vida e por que, de todos os sonhos de juventude que tinha, este seja o único do qual nunca abdiquei.

Como se sentiu ao tornar-se um autor publicado?
Esta é uma questão cuja resposta será longa e levar-me-á a referir aspectos que poderão - à primeira vista - não estar relacionados, mas estão.
Em 2008, a publicação de «Império Terra: o princípio» foi a realização de um sonho. Foi uma tempestade emocional, porque acreditei que dali em diante tudo seria melhor e mais fácil. Acontece que o mercado editorial tem as suas idiossincrasias e eu não estava preparado para elas. Foram 6 meses de felicidade e depois veio o desânimo e a revolta. Em 2010, quando publiquei o segundo livro da Trilogia Império Terra - «Guerra da Pirâmide» -, acreditava ter dominado parte dessas idiossincrasias, por isso escolhi melhor a editora, escolhi a minha própria capa - é única, porque foi desenhada de propósito para o livro - e fiz um excelente lançamento; acreditei que este livro poderia ser a minha afirmação... Mas por vicissitudes do mercado editorial o livro nunca saiu dos armazéns. Por isso, ser um autor publicado é bom, quando se tem uma editora tradicional por trás; em regime de autopublicação, não é muito saudável: não há garantias, não há esforço promocional, não há venda do produto nem do autor e - ainda por cima - pagou-se.
Contudo, quero deixar claro que não sou contra a autopublicação: é uma alternativa para quem quer publicar e enquanto não consegue chegar a uma editora tradicional. Eu próprio recorri a ela, em 2014, para publicar o ebook «Marta» e tenciono voltar a recorrer se, entretanto, não conseguir publicar por uma editora tradicional. Eu defendo que os autores não se deixem amordaçar pelo facto das editoras tradicionais não os publicarem; digo isto, porque apesar de escrever ser uma coisa que me faz bem, que me completa, que dá um sentido maior à minha vida e um propósito no mundo, nada disso será possível se não for lido; e talvez tenha sido por isso, por me sentir assim, que tenha começado a avançar com um projecto denominado de EPA|Escritores Portugueses Autopublicados - uma plataforma de divulgação dos autores que se autopublicam em Portugal -, mas a ideia de autopublicação é tão mal vista que são os próprios autopublicados a não admitirem que o são. De todos os convites que fiz - poucos se dignaram a responder -, não houve uma única resposta positiva.

Identifica-se com alguma das suas personagens?
Todos as personagens reflectem uma parte de nós; mesmo os vilões. Este fenómeno de transferência ocorre inconscientemente e, muitas vezes, só nos apercebemos disso quando relemos o que escrevemos, muito tempo depois. Para muitos, escrever funciona como uma espécie de descarga emocional, uma catarse, e por isso é natural que muitos dos seus processos mentais resultem numa transcrição para os textos dessas emoções transmutadas em acções ou pensamentos das personagens. De uma forma ou de outra, as personagens reflectem-nos sempre, nem que se seja num detalhe, e por isso é natural que nos identifiquemos mais com algumas personagens do que com outras, consoante o nível de transferência que fizemos.
Mas este fenómeno é também uma necessidade do processo de escrita, esta transferência do escritor, ou de outras pessoas que o escritor conhece, para a personagem, é isto que humaniza uma personagem e que a torna credível para o leitor, porque só assim o leitor se pode, por sua vez, identificar com as personagens; se a personagem não tiver essa carga emocional, dificilmente um leitor a aceitará e o livro perderá a sua função, tornar-se-á uma pilha de folhas.

A segunda parte da entrevista será publicada brevemente!

1 devaneios:

Ana C. Nunes disse...

Olá!
Conheço o trabalho do Paulo Fonseca, através do "Império Terra" e foi curioso ler esta entrevista e ver a sua visão da publicação que, afinal, acaba por ter muito em comum com outros escritores em situações similares.
Achei interessante o conceito a EPA|Escritores Portugueses Autopublicados, mas acho que, de certa forma, é fácil perceber porque é que tantas pessoas, em Portugal, têm medo de dizer que são auto-publicados. Isto porque os leitores ainda vêem com maus olhos esse tipo de publicação. O que está errado, com certeza.

Gostei desta primeira parte da entervista.

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